Lançado no início de julho, o livro “Perspectivas jurídicas para um futuro sustentável: reflexões do FOPEMA sobre mudanças climáticas e combate ao desmatamento” traz a visão inédita dos procuradores do Fórum de Procuradores de Estado do Meio Ambiente da Amazônia Legal (FOPEMA) sobre temas que vão do mercado de carbono à segurança pública.
Nesta entrevista, Rodrigo Neves, presidente do Fórum, destaca o papel fundamental da iniciativa Diálogos pelo Clima, explica que os temas escolhidos para os artigos da publicação refletem a necessidade diária da atuação dos Procuradores de Estado e ressalta que a obra serve como referência sobre os desafios enfrentados pelos procuradores da Amazônia.
Como o Sr. avalia a iniciativa Diálogos pelo Clima? Qual é a sua importância?
A iniciativa Diálogos pelo Clima tem sido fundamental no âmbito do FOPEMA, proporcionando um espaço de diálogo entre as procuradorias de meio ambiente dos estados da Amazônia Legal. Alinhada aos objetivos do projeto, a troca de informações entre diferentes atores do sistema de justiça brasileiro sobre clima e florestas é essencial. Essa iniciativa tem sido importante para a construção de mecanismos jurídicos mais eficazes e efetivos no nosso setor. Ao reunir advogados dos estados amazônicos, fomenta a colaboração e o desenvolvimento de estratégias conjuntas para enfrentar os desafios ambientais da região. Em outras palavras, por meio dos Diálogos pelo Clima, temos promovido uma troca de conhecimentos e experiências que fortalece a formulação e a implementação de políticas públicas voltadas para a sustentabilidade ambiental na região.
De que forma o diálogo e a interação com os segmentos da sociedade civil organizada, trazidos pelos Diálogos, contribuem para a atuação dos Procuradores na prática?
Essa interação tem sido especialmente importante para o FOPEMA. Ao articular debates com a iniciativa privada, governo federal e instâncias do poder judiciário, juntamente com a capacitação e criação de conhecimento, estabelecemos uma rede de informação essencial para a atuação dos procuradores de meio ambiente. A área ambiental é acostumada, por força dos movimentos participativos, a ouvir as demandas e perspectivas da sociedade civil, o que auxilia na compreensão dos impactos das mudanças climáticas e do desmatamento nas comunidades locais, tornando as ações mais direcionadas e efetivas. A participação da sociedade civil contribui para a construção de soluções mais justas e equitativas, que considerem as necessidades e direitos das populações afetadas, enriquecendo o debate e a construção de soluções inovadoras e sustentáveis.
Como se deu a escolha dos temas prioritários abordados no livro “Perspectivas Jurídicas para um Futuro Sustentável”? Quais foram os critérios?
A escolha foi baseada em critérios como relevância, urgência, impacto e contemporaneidade para a redução do desmatamento ilegal e a mitigação das mudanças climáticas na Amazônia. Foram considerados temas de atuação corrente dos Procuradores do Estado, através do suporte e assessoria jurídica aos estados da região. Os temas escolhidos — mercados de carbono e pagamentos por serviços ambientais, conversão de multas ambientais, segurança pública e meio ambiente, e áreas protegidas — refletem os principais desafios enfrentados pela Amazônia Legal e a necessidade diária da atuação dos Procuradores de Estado.
Para quais segmentos da sociedade essa obra é importante?
A obra é de interesse para gestores públicos em geral, e para profissionais do direito em especial, além da sociedade civil e academia. Serve como uma fonte de referência sobre os desafios enfrentados pelos procuradores da Amazônia e como uma manifestação pública de posicionamentos conjuntos das procuradorias de todos os estados da Amazônia, com grande peso jurídico e político. O conteúdo do livro fornece uma base jurídica referencial e atualizada, que pode auxiliar no debate e formulação de políticas públicas e na tomada de decisões informadas. Para o público em geral, é interessante para o conhecimento de temas relevantes à proteção da Amazônia, promovendo um engajamento mais efetivo e consciente na busca por um futuro sustentável na região.
Num bioma tão complexo e diverso, quais desafios o senhor enxerga como sendo os principais a serem enfrentados, a partir de cenários tão diferentes em cada estado da Federação?
Os desafios são variados e complexos. Como se costuma dizer, não há apenas uma Amazônia. Ela é muito diversa, e os problemas enfrentados pelo Pará não são análogos aos do Acre, ou os do Maranhão aos de Rondônia, por exemplo. Há inúmeras diferenças sociais, econômicas e ambientais, exigindo soluções específicas e adaptadas à cada realidade local. Por outro lado, há muitos pontos semelhantes, e os Diálogos pelo Clima têm ajudado a estruturar esses temas, como evidenciado pela publicação. Questões como desmatamento, financiamento climático, mercado de carbono e gestão territorial, incluindo a preservação dos espaços públicos ambientalmente protegidos e a garantia de direitos e repartição de benefícios com comunidades tradicionais e indígenas, são temas permanentes. Além disso, é crucial promover o desenvolvimento da bioeconomia na região e de cadeias sustentáveis que conciliem a conservação ambiental com o progresso socioeconômico das comunidades locais, ao mesmo tempo em que se viabilize a efetividade das ações de comando e controle, inclusive na cobrança de multas e atuação contra grilagem.
Cada estado apresenta cenários e necessidades específicas, exigindo abordagens adaptativas e colaborativas para enfrentar esses desafios de maneira integrada e eficiente, e os procuradores têm um papel central nesse processo. Somos parceiros na promoção de inovações jurídicas, com ousadia responsável.
Cite bons exemplos de soluções já encontradas e que vêm sendo colocadas em prática, dentre os temas abordados no livro.
Um exemplo de atuação do FOPEMA em soluções para a região é a participação, em conjunto com o Consórcio da Amazônia Legal e os Secretários de Meio Ambiente da região, no debate nacional sobre o Projeto de Lei do Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões (SBCE), atualmente em tramitação no Congresso Nacional. Essa iniciativa visa criar um mecanismo regulatório eficiente para reduzir as emissões de gases de efeito estufa, incentivando práticas sustentáveis e gerando benefícios econômicos e ambientais. Entretanto, forças políticas e econômicas podem gerar um modelo jurídico excludente para a Amazônia e seus povos tradicionais. O FOPEMA elaborou robustas notas técnicas, apresentadas aos Secretários de Meio Ambiente ligados ao Consórcio da Amazônia Legal, culminando na emissão de uma nota conjunta dos nove governadores da Amazônia Legal, atuação coletiva que abriu espaço para negociações com o Congresso Nacional e atores políticos. Estamos atentos e atuantes. Há muito a fazer e os desafios são enormes para a proteção da Amazônia e para a eliminação do desmatamento ilegal na região.